35ª Bienal de São Paulo
6 set a 10 dez 2023
Entrada gratuita
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35ª Bienal de
São Paulo
6 set a 10 dez
2023
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Registros da visita em obras de MAHKU. Foto: Tailicie Nascimento

Uma jornada para a Floresta de infinitos

“Uma jornada para a Floresta de infinitos” é como desaguar num rio de emoções. Tratar de cada momento dessa jornada é manter vivas as experiências. A proposta tem início com a mediadora Lia, em suas narrativas lúdicas, proporcionando o envolvimento com gestos, andanças, explorando as expressões corporais, a imaginação, coreografando os corpos no tempo e no espaço desta Bienal. A mediadora Ricarda Wapichana, com suas vestes tradicionais, já está pronta, aguardando nas obras do MAHKU, o Movimento dos Artistas Huni Kuin, que têm cores vibrantes, geometrias sagradas e temas que traduzem suas cantorias. Paramos para ouvir Ricarda entoar uma canção tradicional do povo Wapichana chamada “Wakunaykian aizii”, uma forma de dizer que estamos felizes celebrando o parixara. Após o canto, uma narração de “Basne Puru Yuxibu: História da aranha encantada”,1 do povo Huni Kuin, contou como a aranha levou seus conhecimentos através da tecelagem e dos algodões coloridos e, depois, resolveu deixar somente os algodões brancos. 

Registros da visita em obras de Ayrson Heráclito e Tiganá Santana e de Carlos Bunga © Levi Fanan/Fundação Bienal de São Paulo

Na obra de Edgar Calel, apreciaram a arte do bordado e a arquitetura da Tekoa (casa guarani). Para tornar mais festiva essa jornada, realizamos uma roda para dançar e cantar o canto guarani mbya chamado “Ñande Mbaraete’i katu”,2 batendo os pés para sentir a vibração do chão e manter a conexão com a terra. Vivenciar e experimentar canções e danças ancestrais foi um convite para adentrar o plano de redescobertas de nossas histórias, identidades e ancestralidades indígenas. Prosseguimos para o deserto dos seis sóis da cura, de Guadalupe Maravilla. As crianças descobriram a brincadeira Tripa chuca,3 que servia de entretenimento para Maravilla. A regra é única, as linhas não podem tocar umas nas outras. 

E, em poucos passos, chegamos à floresta. E todos ali estavam preparados para se aventurar na Floresta de infinitos (2023), de Ayrson Heráclito e Tiganá Santana. Como orientam as tradições, todos disseram: “Agô, licença para entrar”. Foi emocionante presenciar esses canais de percepção para sintonizar o silêncio e ouvir o sutil vento soprando, levando-os para fora. Na saída da floresta, depararam com uma bela lagoa com os barcos em círculo, no vídeo de Manuel Chavajay. E, mais uma vez, ficamos com a contação de história de Ricarda: “O Grilo e a Onça”. Esses animais lutaram em defesa da Terra, e viveram dias intensos em rituais em meio à taquara, a floresta de bambus, e só o amor, a amizade e a cumplicidade superaram vários desafios em prol da mãe Terra. Um deles deixou pegadas e rastro de memórias onde nunca se apaga: no coração. 

Aproximando-se do encerramento, percorremos a obra de Anna Boghiguian. Foi encantador observar as crianças apreciando o algodão que a aranha, da história contada no início da visita, deixou. Na última obra, o chão rosa de Carlos Bunga, adultos e crianças puderam tocar a textura e a materialidade do trabalho. Assim, a pedagoginga, conforme o escritor Allan da Rosa menciona, é ter esse gingado das palavras, dos cantos, uma forma de aprender cantando, brincando juntos, experimentando e, principalmente, pela oralidade, aprender sem caderno e sem lápis. Por aqui ficam meus profundos agradecimentos à equipe de educação, aos participantes, às crianças e aos familiares que deram um brilho especial para que pudéssemos executar essa jornada na 35ª Bienal.4

    • “Basne Puru Yuxibu: História da aranha encantada”, in Una Shubu Hiwea: Livro Escola Viva do povo Huni Kuin do rio Jordão. São Paulo: Itaú Cultural, 2017. p. 44-46. Disponível em  issuu.com/itaucultural/docs/publicacao_unashubuhiwea. Acesso em 2023
    • Vídeo com versão de “Ñande Mbaraete’i Katu”. Disponível em www.youtube.com/watch?v=_5fE9Rwfyb8. Acesso em 2023. 
    • Sugestão para o jogo infantil, conhecido em El Salvador como Tripa chuca, composto pela conexão de números com linhas que formam um padrão abstrato: uso de papel, canetinha, giz e carvão. Caso não tenha esses itens, pode ser usada a ponta do dedo, vareta ou galhos para riscar o chão ou a areia de praias e desertos. 
    • Este texto é a transcrição do relato oral feito por Ricarda Wapichana à Lia Yokoyama Emi. Ambas mediadoras realizaram a visita em conjunto.