35ª Bienal de São Paulo
6 set a 10 dez 2023
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Vista da performance A língua sempre se dobra diante do inquestionável ou maldito - livro-performance capítulo VI, de Rubiane Maia na 35ª Bienal de São Paulo – coreografias do impossível © Levi Fanan / Fundação Bienal de São Paulo

Rubiane Maia

Atirar insistentemente uma sequência de pedras em direção ao oceano, investigar o corpo como receptáculo da força dos ventos, realizar deslocamentos em sinergia com o reino mineral, esgarçar o tempo da escrita em relação à duração das plantas, respirar memórias a partir da capacidade sônica para acessar tempos imemoriais, lixar madeiras para escavar os textos presentes na própria pele, são alguns (entre os muitos) gestos que estruturam a tessitura conceitual e transdisciplinar de Rubiane Maia. 

O que está em jogo nas situações propostas pela artista, que tem sua produção guiada por um híbrido entre performance, imagens e escrita, é sempre a construção de um estado de percepção que permite ao seu próprio corpo (e ao de quem com ele se afeta) a possibilidade de alargamento e transmutação do que nele está inscrito através do tempo. 

Um corpo que escuta, alimenta e multiplica as frequências, vozes e gritos que nos antecedem. Se cada um de nós é a condensação da história vivida desde o nascimento e antes dele, quando uma memória [ou um conjunto de memórias] se atualiza por meio de uma ação performática, ela deixa de ser memória ou fantasma para se tornar uma percepção coletiva, uma constelação.1 

Nesse sentido, o corpo, nos contextos que são evocados por Maia, extrapola (ou mesmo recusa) as concepções biológico-histórico-ocidentais a ele atribuídas, tornando-se um conjunto de forças em estado de diferenciação capazes de mobilizar novas paisagens, saídas e saúdes. Sempre considerando a paisagem e o meio (sobretudo não humano) como cocriadores de suas obras, a artista [re]afirma seu compromisso com a vida em um jogo que envolve tanto um exercício de fabulação crítica (e clínica) como um brotamento daquilo que poderíamos chamar de cuidado. Esse cuidado, contudo, eleva-se, amplia-se em direção a um estado coletivo, carregando em si uma rede de histórias, relacionamentos e perceptos coletivos e individuais. 

Em Book-Performance [Performance-Livro], projeto em desenvolvimento e apresentado na 35a Bienal de São Paulo, Rubiane Maia organiza uma série de ações, pensadas em resposta a textos autobiográficos particularmente influenciados por memórias transgeracionais traumáticas ligadas a questões de gênero e raça. Através do gesto e da colaboração com outras performers (sempre atravessadas por questões comuns a sua história, inscrita pela migração, pela maternidade e pelo pensamento diaspórico), a artista elabora uma metodologia texto- -corporal que deseja “metabolizar memórias complexas ou indigeríveis em pequenas doses de cura e liberdade”.2 

tarcisio almeida

1. Notas sobre a prática da artista. Ver mais em: www.rubianemaia.com/.
2. Ibid.

Rubiane Maia (Caratinga, MG, 1979. Vive e trabalha em Vitória, ES e Folkestone, Reino Unido) conjuga performance, vídeo, instalação e escrita em sua prática artística. Trabalha ainda com desenho, colagem e  pintura. Participou do workshop Cleaning the House, de Marina Abramovic e da exposição Terra comunal – Marina Abramovic + MAI, no SESC Pompeia (São Paulo, Brasil) com  a performance O jardim (2015). É integrante do coletivo internacional de artistas Speculative Landscapes. Desde 2018, organiza ações em capítulos que compõem um ‘Livro-Performance’ a partir de textos autobiográficos que tratam de situações de racismo e misoginia.