35ª Bienal de São Paulo
6 set a 10 dez 2023
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São Paulo
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2023
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Vista de obras de Nadal Walcot durante a 35ª Bienal de São Paulo – coreografias do impossível © Levi Fanan / Fundação Bienal de São Paulo

Nadal Walcot

No ato da repetição reside a potência da variação. Nesse teatro de sombras da memória, as imagens vão e vêm, mas nunca são as mesmas, pois, no detalhe, toda coisa é outra coisa. O punho que inclina o facão no corte da milionésima cana-de-açúcar, o quadril espiralando-se nos bailes de rua, ano após ano, a mão curvando-se à vontade imperiosa de um desenho que exige mais esforço físico e mais tinta no papel. Ninguém faz a mesma coisa duas vezes: é isso o cotidiano. Nos canaviais, nas cidades ou nos ateliês. O artista dominicano Nadal Walcot (1945- 2021) estava ativamente a par desse estado de coisas – sem esconder uma dívida que tinha com M.C. Escher. Walcot, que aprendera muitas línguas em seu ofício juvenil de intérprete, acaba por operar outro tipo de tradução: das cenas do dia a dia para a linguagem do desenho. As locomotivas fumegantes, a exploração do trabalho nos engenhos de açúcar, as tramas e transações da mercancia nos portos. As paisagens são sempre humanas, mesmo se virmos apenas a figura de um trem. Quando criança, Walcot costumava entrar escondido em um vagão e passava dias fugido de casa, para, na volta, ser chicoteado pela avó. 

Também na dança revela-se a inteligência de seu traço, inclusive quando incorpora e recria as expressões da música e dos bailes cocolos (termo usado na República Dominicana para designar os imigrantes hispanofalantes de ascendência africana do Caribe). Nessas obras, as linhas das figuras humanas carregam-se na mesma matriz energética das culturas que compõem as coreografias da memória pessoal e coletiva. Assim, emergem dos assuntos – bem como da forma – a força das contradições subjacentes a uma realidade histórica, testemunhada e modificada por um artista que interpreta a violência colonial mas também a euforia do povo nas festas; que vê o avanço da industrialização chegar apenas para os poderosos. 

igor de albuquerque

Nadal Walcot (San Pedro de Macorís, República Dominicana, 1945-2021) foi um artista que teve como base de sua formação a cultura cocolo – desenvolvida pelos descendentes de escravizados das ilhas colonizadas por ingleses no Caribe. Exilado político, viveu no México, Estados Unidos e Europa. Sua obra inclui a narração visual do cotidiano e dos mitos afro-caribenhos.

Esta participação é apoiada por Consulado Geral da República Dominicana em São Paulo.