35ª Bienal de São Paulo
6 set a 10 dez 2023
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35ª Bienal de
São Paulo
6 set a 10 dez
2023
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Vista da instalação de Kidlat Tahimik na 35ª Bienal de São Paulo – coreografias do impossível © Levi Fanan / Fundação Bienal de São Paulo

Kidlat Tahimik

Mais conhecido como cineasta independente, Kidlat Tahimik é autor também de instalações feitas em grande escala. Enormes e complexas, suas cenografias desenvolvem narrações indígenas que confrontam as narrativas coloniais e imperialistas. Preocupado principalmente com o extermínio e a destruição de figuras mitológicas genuínas, o artista recria, com nuances épicas, os choques entre culturas. As múltiplas histórias e as muitas cenas que ganham forma em suas esculturas de madeira parecem saídas da mente de um roteirista de Hollywood. Por fim, personalidades históricas mesclam-se a personagens fictícias, promovendo um colapso no tempo, nos períodos consolidados e em geografias distantes. 

Para a instalação na 35ª Bienal de São Paulo, Tahimik propõe um friso improvável que dispõe, lado a lado, figuras mitológicas ancestrais: Igpupiara (termo tupi que significa monstro marinho) e Syokoy (espécie de homem-sereia), originárias respectivamente de povos indígenas brasileiros e de povos filipinos. Esse é apenas um capítulo da viagem de circunavegação do explorador Fernão de Magalhães, na qual a invasão abre espaço para a necropolítica que se estende para muito além dos seres humanos. Primeiro representadas como monstros, depois exterminadas, as figuras de Igpupiara e Syokoy personificam o assassinato de imaginários tribais, um profundo e implacável genocídio cultural que amplifica sua tragédia com o capitalismo ecocida racial. Helicópteros, motosserras e mísseis num confronto desigual com criaturas meio humanas, meio animais, em cenas que ecoam parques temáticos interculturais, de algum modo inspirados na lógica das exposições do século 19, organizadas pela empresa colonial. Ao desorganizar os cronótopos herdados dos discursos modernos, que fizeram do saque e do extrativismo formas legítimas de governo planetário, o artista dispõe em primeiro plano outra sombra da violência. Desfazer as narrativas imperiais por meio da lógica degenerativa das histórias contadas uma e outra vez constrói uma forte contraimagem do progresso. Em um mundo pós-colonial, a capacidade inventiva apoia-se em torções, combinações e mesclas do passado, a despeito das categorias que mantêm separadas formas de vida, construções imaginárias comuns e conhecimento. Desse modo, estabelecer contato com as instalações de Tahimik é como entrar em um ferro-velho legado por todos os regimes imperiais. 

carles guerra
traduzido do inglês por gabriel bogossian

Kidlat Tahimik (Baguio, Filipinas, 1942. Vive em Baguio, Filipinas) trabalha com cinema, fotografia, tecelagem, arquitetura e instalações, tratando, sobretudo, de questões ambientais. Em parceria com artesãos locais e materiais encontrados, ele projetou e construiu dois centros de artes. Organiza conferências que reúnem povos indígenas de todo o mundo. Seu primeiro filme, Perfumed Nightmare (1977) recebeu o Prêmio Internacional dos Críticos (Berlim, Alemanha).