35ª Bienal de São Paulo
6 set a 10 dez 2023
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São Paulo
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Vista da obra The Camera of the Dispossessed [A câmera dos despossuídos], de Kamal Aljafari na 35ª Bienal de São Paulo – coreografias do impossível © Levi Fanan / Fundação Bienal de São Paulo

Kamal Aljafari

A obra de Kamal Aljafari parte da crença e da exploração do poder do cinema de prestar testemunho. Para um artista palestino trabalhando após a Nakba1,  essa afirmação pode parecer paradoxal. Nas mãos de Israel, o cinema tem constantemente servido como ferramenta de colonização, excluindo os palestinos das representações de suas próprias paisagens e espaços urbanos. Assim, como observa Aljafari, o povo palestino é duplamente desenraizado – na vida real e também no cinema. 

Mas nenhuma expropriação jamais é total. Assim como as pessoas, os pixels também resistem. Em Recollection [Recordação] (2015), Aljafari se envolveu em um esforço minucioso e brilhante para desfazer o que ele chama de “ocupação cinematográfica”. Ele explorou três décadas de filmes de ficção israelenses produzidos em Jaffa, sua cidade natal, em busca daquilo que os fotogramas involuntariamente preservam: a imagem da arquitetura da cidade como foi um dia, e a imagem de muitos palestinos, incluindo seus familiares, que acidentalmente aparecem ao fundo porque, por acaso, passavam ali quando a cena estava sendo filmada. Munido de uma confiança em imagens de baixa resolução, ele usa a montagem e a manipulação de imagens como ferramentas cinecoreográficas, para trazer esses fantasmas silenciosos ao primeiro plano, fazendo que a representação espectral surja de sua impossibilidade. 

Em outros projetos, como Port of Memory [Porto da memória] (2010), Aljafari enfoca espaços íntimos e familiares os quais, em uma espécie de tempo suspenso, a repetição de rituais diários aparece como uma maneira de impedir a catástrofe iminente. Em The Camera of the Dispossessed [A câmera dos despossuídos] (2023), seu projeto para a Bienal de São Paulo, ele experimenta com o formato da instalação, empregando justaposição, montagem e efeitos visuais para se reapropriar criticamente de imagens históricas saqueadas do Centro de Pesquisa Palestino, em Beirute, em 1982, pelo exército israelense. 

omar berrada
traduzido do inglês por mariana nacif mendes

Kamal Aljafari (Ramla, Palestina, 1972. Vive em Berlim, Alemanha) trabalha com imagens em movimento, entrelaçando ficção, não ficção e arte. Seu trabalho foi exibido em vários festivais e instituições internacionais de cinema. Em 2021, foi membro do júri da seção Leopard of Tomorrow do 74º Festival de Cinema de Locarno (Suíça). Ele foi um artista de destaque no Robert Flaherty Film Seminar (Nova York, EUA) e foi bolsista do Radcliffe Institute and Film Study Center da Harvard University.

1. O termo árabe Nakba significa “catástrofe” ou “desastre” em português, e remete ao êxodo palestino de 1948, quando mais de 700 mil árabes palestinos, conforme dados da Organização das Nações Unidas (onu), fugiram ou foram expulsos de suas casas em razão da guerra civil de 1947-1948 e da Guerra Árabe-Israelense de 1948. [n.e.]