35ª Bienal de São Paulo
6 set a 10 dez 2023
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São Paulo
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Vista de obras de Charles White durante a 35ª Bienal de São Paulo – coreografias do impossível © Levi Fanan / Fundação Bienal de São Paulo

Charles White

“Sou negra, mulher, escultora e gravurista. Também sou casada, mãe de três filhos e avó de cinco garotinhas (agora sete meninas e um menino) […] todos esses estados-de-ser influenciaram meu trabalho e os tornaram isso que você vê hoje.”
– elizabeth catlett

Os processos colaborativos têm uma tradição fecunda no México, e uma das iniciativas amplamente difundidas é a do Taller de Gráfica Popular [Oficina de gráfica popular], mais conhecido como TGP, que data de 1937. Vários dos fundadores dessa iniciativa vieram da Liga de Escritores e Artistas Revolucionários (LEAR). Trazendo a reverberação dos preceitos promovidos pelo muralismo, eles promoveram uma produção visual comprometida com as lutas e a justiça social, denunciando situações vividas por camponeses e trabalhadores e, principalmente, resistindo e questionando mensagens, efeitos ou práticas ligados aos fascismos dominantes.

Os trabalhos gráficos do TGP – que traziam o espírito de agitação e de propaganda – circulavam também por meio de cartazes, folhetos e calendários, apelando para a militância visual e a crítica aos modelos de produção centrados no artista individual.

O TGP promovia, em vez disso, recursos organizacionais de natureza coletiva, por meio de reuniões e assembleias, como se pode observar pelas fotografias. Nelas, discutia-se o que representar, como formar o grupo de voluntários que produziria a imagem, cuidando para que o agente responsável fosse reconhecido e, ao mesmo tempo, o exercício coletivo por meio do carimbo/logotipo característico do TGP.

Em março de 1938, o TGP aprovou um documento no qual seus interesses e objetivos foram detalhados. Esse documento era uma espécie de manifesto ou declaração no qual concordaram em trabalhar com litografia, gravura em metal, madeira e linóleo.

Esta oficina é constituída com o objetivo de estimular a produção gráfica em benefício dos interesses do povo do México e, para isso, propõe-se a reunir o maior número de artistas em torno de um trabalho constante, principalmente por meio do método de produção coletiva.1

Embora esse documento não tenha sido publicado, anos depois, em março de 1945, eles publicaram sua Declaração de princípios, na qual se autorreafirmaram como um centro de trabalho coletivo cuja função consistia na realização de uma arte a serviço do povo, de modo que sua produção deveria refletir as realidades sociais de seu tempo.

Como outras estratégias coletivas empreendidas ao longo do tempo, o TGP teve vários momentos de coesão e tensão interna, seus participantes variaram em número e origem geográfica. Entre eles estavam artistas como Leopoldo Méndez, Pablo O’Higgins, Luis Arenal e Adolfo Mexiac. Também contou com importante participação de mulheres artistas, como Mariana Yampolski, Rini Templeton, Elizabeth Catlett e Margaret Taylor Goss Burroughs, cujos trabalhos no contexto dos novos feminismos e da depatriarcalização da história, têm sido reavaliados e ressituados.

Dado o grande desempenho artístico e a profusa atividade política do TGP, vários artistas estrangeiros (principalmente estadunidenses) se ligaram temporariamente à oficina para contribuir com seus trabalhos na produção de gravuras sociopolíticas. Esses artistas eram chamados “artistas convidados” e alguns deles eram John Woodrow Wilson, Hannes Meyer, Lena Bergner, Charles White, Eleanor Coen, Margaret Taylor Goss Burroughs, Rini Templeton, Elizabeth Catlett, entre outros. Esses vínculos consolidaram o caráter internacional do TGP e, de certa forma, fizeram surgir outros projetos relacionados, como os Workshops of Graphic Art [Oficinas de Arte Gráfica], em Los Angeles, San Francisco e Nova York, nos Estados Unidos.2

Outro artista convidado foi Charles White, como Catlett, de origem afro-americana, cuja produção se concentrou principalmente no combate às distorções e aos estereótipos sobre os afro-americanos, que eram disseminados na cultura visual popular. Com o passar do tempo, seus interesses ligaram-se a realidades políticas, sindicais e de gênero. White viajou para o México em 1946, acompanhado por Catlett, e, ao entrar em contato com o TGP, reafirmou seu interesse pela gravura, dado o alcance que ela poderia ter em virtude da reprodutibilidade, da diáspora e da circulação que as tiragens permitiam e de seu baixo custo de produção.

White retornou a Nova York em 1949 e colaborou com o New York Graphic Workshop, que, assim como o TGP mexicano, teria um importante efeito na disseminação da arte gráfica social, especialmente na defesa dos direitos dos afro-americanos. Alguns de seus retratos se sobressaem, como o de Bessie Smith, pioneira desse estilo e popularmente conhecida como a “imperatriz do blues”, que foi enterrada em um túmulo sem lápide até que Janis Joplin escreveu o seguinte epitáfio: “A maior cantora de blues do mundo jamais deixará de cantar. Bessie Smith, 1895-1937”; ou o retrato de Frederick Douglass, que esteve ligado a várias iniciativas antiescravagistas e promoveu o abolicionismo. Douglass nasceu no cativeiro e, portanto, desenvolveu perspectivas críticas sobre liberdade e direitos humanos, principalmente em relação às comunidades afro-americanas que, como ele, foram submetidas ao regime da escravidão.

getsemaní guevara e sol henaro
traduzido do espanhol por ana laura borro

Charles White (Chicago, IL, EUA, 1918 – Los Angeles, CA, EUA, 1979) foi desenhista, gravador e pintor. Entre seus trabalhos mais conhecidos está o mural The Contribution of the Negro to American Democracy (1943), na Hampton University. Suas obras estão nas coleções do Metropolitan Museum of Art, MoMA (Nova York, EUA) e Smithsonian American Art Museum (Washington, DC, EUA), entre outros.

1. Humberto Musacchio, El Taller de Gráfica Popular. México: FCE, 2007, p. 25.
2. Ver Alberto Hijar Serrano, Catálogo TGP 80 años. Taller de Gráfica Popular. Cidade do México: Museo Nacional de la Revolución, 2017, p. 39; Humberto Musacchio, op. cit., pp. 30-60