35ª Bienal de São Paulo
6 set a 10 dez 2023
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São Paulo
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Vista de obra Una voz para Erauso. Epílogo para un tiempo trans [Uma voz para Erauso. Epílogo para um tempo trans], de Cabello/Carceller durante a 35ª Bienal de São Paulo – coreografias do impossível © Levi Fanan / Fundação Bienal de São Paulo

Cabello/Carceller

Desde seu surgimento no cenário da arte contemporânea em meados da década de 1990, o trabalho de Helena Cabello e Ana Carceller questiona os dispositivos e as convenções de representação de sexualidades e identidades fora da norma. 

Em Una voz para Erauso. Un epílogo para un tiempo trans [Uma voz para Erauso. Um epílogo para um tempo trans] (2021-2022), as artistas trazem para o presente a complexa biografia de Antonio de Erauso. Conhecido como “A freira alferes”, foi um personagem do barroco colonial espanhol famoso por ter conseguido contornar o binarismo de gênero imposto aos corpos do Império. 

A obra se desenvolve em um jogo de distanciamento que tece uma temporalidade queer e quase fantológica.1 Quatro séculos depois, três pessoas trans não binárias questionam o retrato do alferes e, por meio dele, desdobram uma questão fundamental: o direito de ser nomeado. No entanto, longe de criar uma nova hagiografia queer, xs protagonistas tensionam a narrativa e expõem suas áreas obscuras: o racismo confesso de Erauso, sua participação no genocídio mapuche, os altos níveis de violência que permeiam sua história. 

Dessa forma, Cabello/Carceller expõem uma série de estratégias que se aprofundam em vários aspectos importantes. O primeiro é que todo retrato é sempre performativo. O segundo, como explica Paul B. Preciado, é que a figura de Erauso é um território discursivo e visual em disputa, um lugar “onde uma multiplicidade de identidades conflitantes é construída e desconstruída”.

Num gesto queer historicamente denso, Cabello/Carceller coreografam nas margens contra-imagens dissidentes. Seja em uma olhada rápida ou por meio de palavras conotadas, essas notas de rodapé revelam genealogias elusivas, descontínuas e bastardas. Como outra adição à pintura a óleo de Van der Hamen, como Una voz para Erauso. Un epílogo para un tiempo trans, as palavras e cenas de Cabello/ Carceller desafiam a integridade do hegemônico e fazem da arte uma ferramenta para abordar o horizonte sempre trêmulo das subjetividades que estão por vir. 

beatriz martínez hijazo
traduzido do espanhol por ana laura borro 

1. No francês hantologie, conceito criado por Jacques Derrida em seu livro Espectres de Marx (1993), em que une os termos hanter [assombrar] e ontologie [ontologia], referindo-se ao persistente retorno às teorias do passado. [n.e.]
2. Paul B. Preciado, “Una voz para Erauso. Epílogo para un tiempo trans”, in Cabello/Carceller. Una voz para Erauso. Epílogo para un tiempo trans. Catálogo de exposição. Bilbao: Azkuna Zentroa – Alhóndiga Bilbao, 2022, p. 14. [n.e.]

Cabello/Carceller (Paris, França, 1963. Madri, Espanha, 1964. Vivem em Madri, Espanha) é uma dupla de artistas criada em 1992. Através de um trabalho interdisciplinar que abrange instalação, performance, vídeo, escrita e desenho, eles desafiam modos hegemônicos de representação e oferecem alternativas críticas. Seu trabalho foi apresentado em exposições individuais, coletivas e em grupo em instituições como o Pavilhão Espanhol na 56ª Biennale di Venezia (Itália), Brooklyn Museum (Nova York, EUA), Moscow Museum of Modern Art (Rússia), Museo Universitario Arte Contemporáneo (Cidade do México, México), Museo de Arte Contemporánea de Vigo (Pontevedra, Espanha) e El Centro de Arte Dos de Mayo (Madri, Espanha), entre outros. Eles também curaram exposições no Espacio Off Limits (Madri), Espacio de Arte Contemporáneo de Castellón (Espanha) e Universidad Europea de Madrid (Espanha).