35ª Bienal de São Paulo
6 set a 10 dez 2023
Entrada gratuita
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35ª Bienal de
São Paulo
6 set a 10 dez
2023
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Registro das obras durante a itinerância da 35ª Bienal de São Paulo no Museu de Arte Moderna do Río de Janeiro © Fabio Souza / MAM Rio

Relatos de experiências

O Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM Rio) abriu os caminhos da itinerância da 35ª Bienal de São Paulo – coreografias do impossível. Com um recorte pensado para a cidade, entre janeiro e abril de 2024, a mostra desenhou possibilidades espiralares de começo-meio-começo, como sugere Antônio Bispo dos Santos. 

Nosso movimento de começo foi, antes mesmo da abertura da exposição, o contato com a equipe de educação da Fundação Bienal de São Paulo em encontros de formação e estudos. Para nós, as conversas com as educadoras foram momentos importantes para conhecermos os dezenove participantes da itinerância, as diferentes propostas de mediação que já haviam sido realizadas e, também, de imaginar coletivamente as possibilidades que se abririam em terras cariocas. As mediações que vivenciamos foram oportunidades de trocas e aprendizados intensos com os públicos, em que histórias, imaginações e narrativas se cruzaram. Enquanto equipe de Educação e Participação do MAM Rio, tivemos em vista propor diferentes maneiras de coreografar os contatos com a Bienal em visitas com público espontâneo, com grupos agendados, em visitas temáticas e oficinas. 

Diálogos dissidentes: arte, gênero e sexualidade foi a nossa primeira visita temática. A partir de algumas obras, objetivamos construir um diálogo coletivo motivado pelas intersecções entre arte, gênero e sexualidade por meio das questões: como corpos dissidentes coreografam possibilidades diante do impossível? Nossa segunda visita temática, Fabulações para Xica Manicongo e Malinche, partiu dos registros e ausências sobre as histórias dessas duas personagens históricas para realizar um exercício conjunto de fabulação e construção de novos imaginários e narrativas sobre suas memórias. 

Para elaborarmos as oficinas, nos inspiramos na própria temática da exposição e, também, nos trabalhos artísticos de Edgar Calel e M’Barek Bouhchichi. No início das oficinas, convidamos os participantes para conhecerem as obras a que fazíamos referência nas atividades e, nesses momentos, eram estabelecidas conexões entre os públicos e os trabalhos. A propósito, a necessidade de escolhermos apenas algumas obras para as práticas, devido ao curto tempo da passagem da mostra por aqui, foi algo extremamente difícil para nós. 

Nimajay Guarani, Casa Grande Guarani, de Edgar Calel inspirou a oficina TecePalavras: oficina de bordado coletivo em que, a partir dos imaginários e repertórios pessoais dos participantes, bordamos conjuntamente, passeando pelas subjetividades e confluências do grupo. Para a oficina Inscrição Poética em Barro, buscou-se um diálogo entre a poesia e o manejo do barro, assim como nos vasos de M’barek Bouhchichi e, por meio de experimentações e possibilidades da argila, a ação sugeriu uma relação entre a materialidade e seus sentidos simbólicos. Refletindo sobre as coreografias do impossível, a artista Juliane Cruz foi convidada para propor experimentações através do corpo, do movimento e da dança na oficina Como coreografar o impossível? Experimentações de movimento. 

Todo esse processo foi desenvolvido coletivamente, porém cada educadora que compõe a equipe se sentiu estimulada e tocada de forma única. As experiências acabaram sendo, também, individuais. 

A educadora Isabela Fonseca destaca: “uma experiência significativa foram as conversas que surgiram com o público durante a mediação dos registros do Quilombo Cafundó. Ao observarem as fotografias do quilombo, algumas pessoas compartilharam comigo lembranças de momentos especiais, como, por exemplo, as histórias da formação da família, a beleza da casa de taipa que os rememorava, a casa dos avós ou a semelhança da Festa de Santa Cruz com a Folia de Reis. A interação com o público no dicionário da cupópia foi uma prática divertida, brincamos e coreografamos a palavra. Foi especial perceber o encantamento dos visitantes ao se depararem em um museu com a presença de pessoas comuns, cujas histórias também são relevantes e merecem ser contadas”. 

Para a educadora Letícia Puri, um aspecto marcante nas mediações foi a diversidade de perspectivas e as possibilidades de mobilização do sensível no contato com as obras. O diálogo com públicos de diferentes idades e contextos, que já conheciam ou nunca haviam ouvido falar da Bienal, nem possuíam contato prévio com arte contemporânea, permitiram conversas e sensibilidades únicas na fruição pela exposição. Visitantes que não se conheciam entraram em contato e criaram laços de afinidade durante algumas mediações. Grupos e indivíduos descobriram o quanto as possibilidades artísticas estão presentes em seu cotidiano, especialmente ao conhecerem alguns acervos, obras e documentos que lhes soaram familiares. Na interação com as múltiplas linguagens e sentidos das obras em coreografias do impossível, estabeleceram-se relações individuais e coletivas com as obras e entre as pessoas, muitas vezes desencadeando em debates complexos, compartilhamento de memórias sensíveis e momentos de emoção, tristeza ou alegria, por exemplo. Nesse sentido, as mediações foram meios de conexão, de diálogos e de criação, uma experiência com valor por si própria. 

A educadora Victória Félix conduziu a oficina TecePalavras: oficina de bordado coletivo. Ela conta que, em pouco tempo, conseguiu ensinar alguns pontos de bordado para pessoas que nunca tiveram contato com uma linha e agulha. Foi uma experiência divertida, muito leve e de muita troca. Ela também conduziu a oficina Inscrição poética em barro. Sobre essa atividade ela relata: “ministrar essa oficina para mim foi surpreendente, não esperava que houvesse um número considerável de participantes. Rio de Janeiro, dia ensolarado e, às nove da manhã, já se formava uma pequena fila. Todos ali desejavam experimentar aquela experiência, sem preocupação de se sujar com o barro ou algo do tipo. Quando convidei os participantes para conhecerem os vasos de M’barek Bouhchichi, poucas pessoas ali haviam visitado a exposição. A apresentação do artista, dos conceitos e das inspirações da própria obra, foi um dos melhores momentos. É bastante gratificante dialogar com o público e mediar seu acesso e apropriação das reflexões e temáticas propostas. Já no momento da oficina, a maioria já tinha em mente o que inscreveria no barro. O processo de preparação da argila foi outro momento de aprendizado, em que as pessoas que já haviam trabalhado com a argila deram dicas e se ofereceram para auxiliar na construção das peças. A oficina foi uma experiência de colaboração coletiva”. 

Por fim, a oportunidade de desenvolver mediações e atividades em colaboração com a Bienal, foi unânime para nós. Por meio das ações propostas, percebemos a relevância dos educadores museais na democratização do acesso às instituições de arte e cultura e aos seus debates contemporâneos, bem como na construção de subjetividades coletivas, que mobilizam reflexões caras à sociedade e imaginários inventivos de formas de ser e estar no mundo.