35th Bienal de São Paulo
6 Set to 10 Dec 2023
Free Admission
A+
A-
35th Bienal de
São Paulo
6 Set to 10 Dec
2023
Menu

O museu sem objetos

Reunião é uma ilha no sudoeste do oceano Índico que foi colonizada pelos franceses no século 17. Ela não tinha população nativa. Os franceses deportaram pessoas escravizadas1 para trabalhar nas plantations de café e açúcar: uma colônia de escravizados. Ela ainda está sob domínio francês no século 21. No ano 2000, um conselho regional de inclinação esquerdista, liderado por membros do partido comunista anticolonial da Reunião, lançou o projeto de um museu que contaria a história da população da ilha, suas culturas, línguas e história: a Maison des civilisations et de l’unité réunionnaise (MCUR – Casa das civilizações e da unidade da ilha da Reunião). Entre 2002 e 2010, trabalhei, com o poeta, acadêmico e escritor reunionense Carpanin Marimoutou, no programa científico e cultural do museu. A construção estava planejada para 2010, mas, naquele ano, a coalizão de esquerda perdeu a eleição regional. Os conservadores que ganharam votaram para acabar com o projeto e, com a cumplicidade do Estado francês, demitiram toda a equipe e dispersaram os arquivos e documentos. Foi a derrota de um museu decolonial.  

A ideia de um museu sem objetos e a concepção de tempo e espaço que tirou totalmente do centro a França e a história colonial foram um anátema para os conservadores e para o Estado francês. Para ser considerado essencial à narrativa nacional e colonial francesa, um museu deve constituir-se de uma coleção de objetos materiais com o discurso universal francês no centro. Nossa abordagem, a despeito de estar ancorada no contexto da ilha da Reunião (antirracista, anticolonial, decolonial), pode ser de interesse para outros contextos.

O ponto de partida para o museu sem objetos foi a ausência de objetos materiais que pudessem testemunhar sobre a vida de escravizados, oprimidos, migrantes, marginalizados e invisíveis. O racismo significou que nenhum dos seus objetos foi salvo ou preservado. O regime escravocrata2 geralmente tem sido representado por objetos da escravização (correntes, chicotes, decretos), e as subjetividades e individualidades de mulheres, homens e crianças desaparecem por trás da representação da dominação racial. Os poucos objetos que foram achados na ilha datavam do final do século 19. A cultura material era colonial, era a cultura d’O Homem, ou seja, do macho branco cristão, como observou Sylvia Winter. Por isso, em vez de procurar objetos e buscar autenticidade, ponderei que deveríamos trabalhar a partir da ausência, adotando-a integralmente. Tal ausência estava, paradoxalmente, afirmando uma presença, a presença de humanos no mundo da desumanização. Enfrentaríamos o discurso colonial racial, que apresentava a ausência criada por ele mesmo como um vazio, uma falta, uma prova de falta de civilização. Além disso, emanciparíamos a história da ilha da temporalidade e da espacialidade do colonialismo francês. A história da ilha da Reunião era a história do inesperado (língua e cultura crioula), do intangível, de lamentos e lutas, alegrias e esperança. O colonialismo francês não nos deu à luz. A fim de recuperar nossa história, tivemos de admitir um passado desconhecido, cujo resgate era “o despertar de um conhecimento ainda não consciente sobre o que ocorrera” e, como escreveu Walter Benjamin, o campo de batalha em que o futuro era decidido.3

A ilha se tornaria um agente da história. Ela não tinha população humana nativa, mas era habitada por pássaros e peixes fabulosos que foram dizimados pelos primeiros colonos, exibindo o impulso colonial para a destruição. Instalada em uma cadeia ativa de vulcões, pertence a uma conexão subaquática sul-sul. Conhecida de navegantes árabes e identificada pelos portugueses no século 17, a ilha integra um eixo africano-asiático. Lutas antiescravagistas foram fortes e comunidades quilombolas4 batalharam nas altas montanhas da ilha.  

A escravidão foi abolida em dezembro de 1848, mas sua sobrevida durou e pode ser encontrada no acesso desigual a saúde, educação e emprego. Em 1946, a ilha tornou-se departamento francês e desde então apresenta altos índices de desemprego e analfabetismo, uma maioria de pessoas abaixo da linha de pobreza, crescentes desigualdades raciais e sociais e é um lugar para franceses brancos experimentarem a nostalgia colonial. 

 

o objeto do intangível

A história e a cultura dos vencidos e oprimidos raramente são corporificadas em objetos materiais. Eles deixam como legado palavras, mais que palácios; esperança, mais que propriedades privadas; vocábulos, textos e música, mais que monumentos. Eles deixam um patrimônio consubstanciado em pessoas, mais que em pedras. Canções, palavras, poemas, declarações, textos, conhecimento sobre as plantas, os pássaros e os animais com frequência constituem o arquivo a partir do qual é possível evocar seu passado. Seus itinerários retraçam a história de lutas, migrações e da organização da força de trabalho em nível global, mais que a acumulação de riqueza. É um mundo do intangível, do inesperado, do que tem sido extemporâneo, doloroso e esperançoso.

A fabricação racial ideológica do perceptível e do imperceptível, do visível e do invisível, do que importa e do que não importa, obedece a regras e leis que são constantemente elaboradas, reconfiguradas, desconstruídas, reconstruídas. Narrativas ganham significado quando entram no campo do reconhecimento ocidental, construído por uma série de gestos legitimados. Criticamos uma representação lógica que reconhece para depois apagar. 

Um de nossos objetivos era a contextualização crítica e a transmissão da cultura reunionense, que, insistimos, era excepcional por seu caráter inter e transcultural. Queríamos chamar atenção para as contingências e os acidentes da história, desafiando a ficção de um curso linear apresentado como inevitavelmente progressivo, marcado por um modernismo, definido pela Europa, no qual cada evento podia ser explicado por uma causalidade estruturante. Usamos “Europa” para designar uma construção histórica e cultural. Para nós, o museu não era um espaço para culturas mortas, fingindo representar a “verdade” ou vendendo-se como um local de “patrimônio” ou um parque temático; seria um lugar para a mudança social, transformador, onde estereótipos seriam enfrentados e narrativas alternativas, discutidas e sugeridas. Tivemos que inventar um espaço que não fossilizasse a história ou a memória, que permanecesse aberto a revisões e reinterpretações, que mostrasse processos e práticas de crioulização5 enquanto restaurava os espaços e as histórias que levaram a ela. O espírito era de uma interpretação não linear, na qual a espectadora seria convidada a “dialogar” com o que visse, poderia sugerir outros significados para coisas e eventos. 

Criticávamos a economia de esbanjamento e desperdício orientada para a destruição das economias locais da cultura vernacular, como um “étnico chique”. Reunião não deveria se tornar um cenário para turistas em busca do exotismo crioulo.6 Prestamos muita atenção à economia material e simbólica do MCUR e por isso, ainda que tenhamos planejado usar técnicas multimídia, nos recusamos a ofuscar o visitante com alta tecnologia, desejando, na verdade, misturá-la com bricolagem de modo a criar uma economia de reciclagem e recuperação. 

 

o objeto do museu decolonial

O objetivo do MCUR não era iniciar uma busca das origens perdidas, tentando restaurar uma autenticidade imaginária ou defender a nostalgia de que “as coisas eram melhores antes”. Alegamos que não havia nada no nosso patrimônio, não importando quão doloroso ele fosse, que nos desse o direito de reivindicar alta retidão. Defendemos o desejo de preservar o patrimônio do esquecimento, da negação e das políticas de silêncio e amnésia definidas pelas autoridades que buscavam impor uma história, uma tradição legítima. Dissemos:

Defendemos os patrimônios porque eles deram origem a narrativas e mitos, porque eles constituem marcos dos quais precisamos. Temos que reinterpretar nossos patrimônios, sujeitá-los a uma apreciação crítica, de modo que algo novo possa acontecer, ou seja, a história. Não temos que ser vítimas de nosso patrimônio, mas reclamá-lo a partir de uma posição crítica, para que possamos passá-lo adiante

Recusamos a hegemonia do objeto no “museu universal” ocidental, onde ele conta uma história (sem objeto, sem história) e mostra o poder e o lugar de uma nação no ranking dos “civilizados”. Mais objetos = civilização mais avançada. De fato, a acumulação de objetos (que soldados, missionários, colonos e mercadores roubaram, pilharam ou adquiriram por coação) tornou-se prova da grandeza do Ocidente. Qualificar o objeto roubado como “arte” é um gesto colonial que mascara uma economia de predação e de consumo. O objeto não seria a única referência; imaginamos instalações com sons, imagens, objetos, literatura oral e atuação para evocar um momento. Buscamos inventar um “pós-museu” que desafiaria o modelo ocidental de museu com sua sucessão de galerias, sua atmosfera de respeitabilidade burguesa e seu conhecimento de cima para baixo.   

Partir de uma ausência e de um vestígio nos levou a revisitar a noção de objeto e, então, a integrar o que existe – a memória do objeto, sua reconstrução – no interior dessa abordagem. Assim, o objeto foi tratado como um vestígio cujo significado emergia de uma fuga social, literária, imaginária, musical, tecnológica e paisagística. Não defendíamos a sacralização do objeto como autêntico marcador da ação humana. Acreditávamos que violência e resistência, paixões e interesses também deviam ser mostrados com sons, imagens, peças teatrais, poemas e narrativas. O objeto era uma ferramenta entre outras, e não precisava ser autêntico. Quando os portugueses entraram no oceano Índico, em 1498, eles trouxeram consigo a violência de anos de guerras religiosas intensas e brutais na Europa. Nelas, a negociação não era uma opção. Povos vistos como inimigos deviam ser esmagados, massacrados, destruídos. Os portugueses impuseram seu monopólio sobre o comércio em um oceano no qual o livre mercado capitalista era a regra. Como podíamos mostrar esse momento? 

A língua crioula receberia um papel importante no MCUR, como itinerário de um arquivo constantemente vivificado. Ela é um vetor de conhecimento sobre práticas e imaginários. É o próprio espaço de uma herança comum, constantemente enriquecido por práticas e contribuições. Na heterogeneidade que rege sua formação, o crioulo necessariamente carrega a marca das línguas, sonhos e imaginários que presidiram seu nascimento inconsciente, subterrâneo, críptico. Mas, de todo modo, é uma língua que emerge nas falas cotidianas das trocas, no discurso poético, nos textos dos ségas e dos maloyas,7 nos provérbios, trocadilhos, charadas. Ela de fato emerge, alterada por encontros que moldam o imaginário do lugar; emerge nos cruzamentos e nas apropriações.

Escolhemos o caminho como metáfora do exílio que cruza rotas de comércio e do império. O caminho evocaria as trilhas dos quilombolas e sua resistência, a apropriação do território pelos pescadores, as veredas dos lavradores, das mulheres do mercado, dos vagabundos… Esses caminhos e trilhas delinearam outra cartografia da ilha. O caminho desenhou o trajeto do ancestral: aquele que vai dele até nós e aquele que vai de nós de volta a ele. A exibição dos itinerários de pessoas, objetos, ritos, práticas culinárias, ingredientes de receitas, sons mostraria as rotas de múltiplos níveis de cultura. A realidade é polimorfa, formada por múltiplas identidades e metamorfoses constantes. Do lugar de origem, de onde o ancestral veio, ao mundo que ajudou a construir e nos legou, o itinerário traz de volta uma vida.  

 

tempo e espaço

Nós argumentamos que estávamos conectados a outras temporalidades e espacialidades além da francesa e da europeia. Nossa história não começava em 1663, quando os franceses tomaram posse da ilha. Pertencíamos aos mundos do oceano Índico, um espaço cultural e comercial milenar que ligava cidades da costa leste da África a outras, nas costas da península Arábica, da Índia, da Indonésia e da China. As mulheres e os homens que o colonialismo francês trouxe para a ilha como escravizados ou trabalhadores contratados não vieram de lugares vazios, sem história, culturas, línguas, leis e formas de organização social. Nosso tempo seria aquele forjado pelas vidas, os movimentos e as lutas dos pobres, colonos, escravizados, contratados e migrantes. Todas as línguas que foram faladas na ilha ao longo de sua história seriam ouvidas – malgaxe, tâmil, bengali, guzerate, bantu, shigazinge, suaíli, chinês –, sem ser sistematicamente traduzidas, pois não queríamos obedecer à regra ocidental de transparência. As ideias que encontraram terreno na ilha – republicanismo, fascismo, comunismo, anticolonialismo, assimilação colonial – seriam exploradas.  

Prestamos bastante atenção à arquitetura. Sem arquitetos-estrela. Escolhemos uma equipe que estava interessada em uma relação próxima entre espaço e conteúdo, que nos ouvia, que entendeu que não queríamos uma separação rígida entre “cultura” e “natureza”, entre “alta” e “baixa” cultura. Um teatro da oralidade estaria no centro do espaço. Os visitantes teriam um lugar para o silêncio e a meditação, para observar as nuvens e o oceano. Ruídos e risadas não seriam proibidos. As plantas e a “Natureza” seriam tomadas como atores da história. Equipamento para a gravação de vozes e imagens dos visitantes estaria acessível todos os dias, para que os reunionenses pudessem desenvolver sua própria cultura visual e sonora. Haveria um espaço para inventar e praticar “a ilha da Reunião no tempo atual”, onde visitantes construiriam o presente em constante mudança. O objeto do museu era o momento do encontro, da troca e do conflito. A exposição seria concebida de tal modo que poderia evoluir sem grandes custos. 

O museu sem objetos seria um espaço para sugerir outras cartografias do mundo e imaginar outros futuros. A história da ilha da Reunião emergira no interior da história da organização da força de trabalho racializada em escala global, e no interior da história da disputa entre potências europeias pelas riquezas do mundo, mas também no interior da história das trocas e solidariedades sul-sul e do universo do oceano Índico. Não idealizamos esse mundo, mas, ao inscrever a ilha Reunião em tal espaço, queríamos desmascarar a mentira da cartografia europeia, questionar o fato de o único vínculo significativo da ilha com o mundo ser através da França. Queríamos desnacionalizar a história do colonialismo.  

Tomamos o cuidado de evitar uma narrativa que situava escravidão e sociedade pós-colonial em um passado encerrado, ignorando seus traços contemporâneos e o pós-vida da escravidão. A narrativa do progresso linear contida na retórica abstrata dos direitos humanos que prevalecera no discurso do abolicionismo francês e no republicanismo paternalista estava excluindo a ilha Reunião da história da emancipação regional, da circulação de ideias revolucionárias. Ela reforçava a dependência que a ilha tinha em relação à França. Contudo, observando os modos pelos quais Reunião fora uma terra no mapa da economia predatória, a história da ilha não ficava mais contida no interior das bordas estreitas da narrativa nacional francesa. Uma cartografia das lutas, circulações, migrações e movimentos de bens, ideias e crenças sul-sul inscreveria a ilha em redes complexas. Além disso, a reflexão sobre a economia predatória levaria a uma exploração da cultura do terror e a uma retórica da proteção contra o barbarismo que busca humanizar o que não pode ser humanizado.  

Processos de crioulização marcaram profundamente a sociedade reunionense, e os compreendemos como algo que ocorreu em uma situação de grandes restrições, sob o jugo da escravidão, do colonialismo e do racismo, de desigualdades profundas, circunstâncias forçadas e estratégias de sobrevivência. Deportação, exílio, uma sociedade muito desigual e violenta, institucionalização da hierarquia racial e resistência a esses sistemas brutais eram a matriz dos mundos crioulos, plurais – uma vez que nenhuma sociedade crioula é semelhante à outra. Vimos a crioulização como um conceito subversivo quando ele permanece ligado a lutas subterrâneas e à resistência de populações confrontadas com um poder duro e brutal, com o monolinguismo e o monoculturalismo. A crioulização significava inventar novas formas de heterogeneidade subalterna radical, minando o espaço hegemônico a partir de dentro; não uma nostalgia nativista ou um retorno às “raízes” – a recriação de um mundo perdido –, nem o único produto de uma zona de contato, mas uma criação que reflete um éthos de resistência e oferece um tipo de pertencimento transnacional. 

No museu sem objetos, o escravizado era concebido como uma figura política que radicalmente contesta, com sua vida, um sistema econômico, cultural e político que fabrica vidas descartáveis para obter lucro. Os escravizados desafiavam uma economia baseada na geopolítica da exploração brutal, na transformação do corpo humano em mero objeto, em leis e regulações que justificavam a racialização do trabalho, que davam a uma minoria o direito de punir, mutilar, torturar, explorar e matar mulheres e homens. Celebraríamos também a capacidade dos oprimidos de criar sentidos e praticar a solidariedade. A crioulização, argumentávamos, leva à invenção de um novo radicalismo, cuja inspiração podia ser encontrada em políticas subversivas antiescravidão.

A derrota brutal do projeto e o apagamento de dez anos de trabalho coletivo demonstraram, mais uma vez, que projetos culturais são políticos quando desenham um tempo e um espaço que desafiam o imperialismo e as concepções racistas. A pacificação e a neutralização da história dos oprimidos são centrais para a perpetuação da dominação e do racismo. O Estado francês poderia ter aceitado um museu sobre a história da escravidão e do colonialismo desde que ele não desse margem para imaginar um mundo pós-racista, pós-capitalista, pós-patriarcal, feminista e queer, desde que a narrativa do progresso sob a tutela europeia tivesse prevalecido, desde que a escravidão e o colonialismo fossem mostrados como equívocos do passado corrigidos pelos Estados que criaram tais regimes. A derrota provou que, sem autonomia total, um museu com um objetivo decolonial está condenado, pois uma instituição descolonizada não pode existir em uma sociedade que não foi inteiramente descolonizada. A invenção de um pós-museu, no qual criemos formas não rígidas de representações, que permaneçam abertas para o inesperado (isso é a história), é uma tarefa para o nosso tempo. 

 

    • No original em inglês, a autora utiliza o termo slave (escravo) para designar pessoas que já nasceram na condição de escravizados. Já a palavra enslaved (escravizado) é utilizada para demarcar o(a) sujeito(a) que se tornou “escravo(a)” (slave) no processo de dominação colonial. Nesse texto, ambos os termos foram traduzidos como “pessoa escravizada”. [n.e.]
    • Slavery (escravidão/regime escravista), no texto original, faz referência ao regime econômico e racial de exploração/ produção do sistema escravista. Já o processo que envolvia práticas diárias de desumanização, desapropriação, generificação e racialização da escravidão são denominados enslavement (escravização). [n.e.]  
    • Walter Benjamin, The Arcades Project, trad. Howard Eiland e Kevin McLaughlin. Cambridge: Harvard University Press, 1999, p. 388.
    • O termo maroon community, no texto original, faz referências às comunidades construídas pelas pessoas escravizadas no contexto do colonialismo europeu. No Brasil, para denominar esses espaços de resistência e construção de territórios negros, são utilizados os termos quilombo, mocambo, ou comunidades quilombolas, solução adotada nesta traduçao. [n.e.]
    • No âmbito dos estudos culturais, o termo “crioulização” se refere, de modo geral, aos processos de interações, encontros e choques entre culturas envolvidas historicamente em contextos coloniais. Também se refere às experiências e práticas culturais resultantes desses processos. Nas palavras de um dos principais pensadores da crioulização, o filósofo martinicano Édouard Glissant (1928-2011), ela produz “uma dimensão inédita que permite a cada um estar ali e alhures, enraizado e aberto, perdido na montanha e livre no mar, em acordo e em errância” (Política da relação, São Paulo: Bazar do Tempo, 2021, p. 59). [n.e.] 
    • No contexto das Antilhas, o termo créole (traduzido aqui como crioulo) se refere à população local surgida após o início da colonização dessa região, e também ao seu idioma.
    • Séga e maloya são gêneros musicais e coreográficos resultantes da mistura de diversos legados culturais e sociais da escravização: são tradicionalmente praticados na Reunião e em outras ilhas do Índico. Disponível em: <www.portail-esclavage- reunion.fr/pt-pt/documentaires/memoria-da-escravatura/ expressoes-artisticas/a-escravatura-uma-fonte-de- -inspiracao/>. Acesso em: 9 mar. 2023. [n.e.] 

About the author

Françoise Vergès cresceu na ilha da Reunião e é feminista decolonial e antirracista, escritora, ativista e curadora. Dois de seus livros foram publicados no Brasil: Um feminismo decolonial (São Paulo: Ubu, 2020; Lisboa: Orfeu Negro, 2023) e Uma teoria feminista da violência (Ubu, 2021).